Quando o crédito fica difícil para empresas, o que fazer?
Mercado e regulador viabilizam alternativas para a captação de dinheiro diante de maiores exigências de instituições financeiras tradicionais em troca de capital

Na linha de frente do crédito para empresas, as financeiras estão com demandas acima do habitual.
Estas instituições ainda disponibilizam crédito mesmo com um cenário econômico de recessão próxima – no Brasil e no mundo - mas impõem juros superiores aos que seriam exigidos por um banco tradicional.

Os grandes bancos, por sua vez, além de existirem em número pequeno no país, têm restringido a oferta de crédito, exigindo mais garantias que o habitual.
As fintechs – os bancos digitais – estão mais focadas no público do varejo e não em empresas. E a oferta de crédito ainda não é uma vocação destas novas instituições.
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“A cada 10 propostas, seis a sete são negadas pelos bancos. Todos acabam pagando o preço da inadimplência alta. Toda vez que sobe, eles fecham a torneira do crédito que fica escasso. Automaticamente, os empréstimos tendem a ficar caros pelo pouco dinheiro na praça e a Selic nas alturas”, explica Dario Bernardo, especialista em crédito e sócio da Solutions Pay Business.
De acordo com a Serasa Experian, em maio deste ano, 6.136.387 empresas estavam inadimplentes. Destas, cerca de 90% são e pequeno e médio portes, representando um total de 5.522.375. As maiores dificuldades de pagamento ficam com os negócios no setor de Serviços (51,6%) e Comércio (39,1%). Os 10,3% restantes ficam com Indústria e outros setores.
Bernardo explica que as empresas vendedoras de mercadorias e serviços com prazos de 30, 60 ou 90 dias, em geral, precisam de bancos como suporte financeiro para fomentar o ciclo operacional.
“Se o banco, no meio do caminho, fecha os limites para empresas anteciparem os recebíveis, elas precisam ir até uma financeira para não correrem o risco de quebrar. Pequenos e médios negócios, geralmente, têm um bracinho a que, na hora do aperto, acabam recorrendo”.
De acordo Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), a oferta de crédito está mais seletiva do que restritiva para uma parcela significativa de micro e médias empresas com baixo capital de giro, muita volatilidade ou perda de vendas em uma época de retração econômica.
“As financeiras, bancos, sociedades cooperativas, fintechs e crédito cooperativo tentaram manter sua clientela fazendo a rolagem de muitos contratos, o que foi feito em larga escala. O crédito ainda está em ritmo forte, apesar da desaceleração. Isso é crédito novo e também refinanciamento de muitos créditos”.
Ainda de acordo com Tingas, as empresas com maior dificuldade de crédito representam um ‘caso a caso’ que, em geral, não pagam nada há meses, levando o banco a considerar o nome inadimplente e leva-lo para as ‘perdas’, ou seja, a lista de devedores duvidosos.
“A oferta de crédito é mais seletiva pela conjuntura, mas ainda é firme. Se o cliente tem capacidade de pagamento futura, renda estável e fluxo de vendas que, apesar da oscilação, garante um retorno positivo, essas empresas estão tendo crédito”.
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No caminho para a capitalização via bolsa de valores, as companhias de maior porte e aptas para ingressar em um processo de IPO – sigla em inglês para oferta pública inicial – também colocaram o pé no freio.
Se o mercado de abertura de capital estava aquecido em 2021 por conta da taxa básica de juros de um dígito - com mínima em 2% no primeiro trimestre de 2021 – a elevação pelo Banco Central até os atuais 13,25% ao ano na tentativa de conter a inflação é balde de água fria nos planos de abertura de capital para muitas empresas.
Os custos das operações de IPO em bolsa de valores exigem fôlego financeiro substancial de companhias.
O último levantamento feito pela consultoria Deloitte sobre as aberturas de capital de janeiro de 2014 a maio de 2020, apontou média do percentual dos custos de ofertas públicas em relação ao valor distribuído de 4,9% para IPOs, de 3,4% para follow-ons – ofertas seguintes a um IPO – e de 3,5% para follow-ons de ofertas restritas sob a instrução CVM 476.
Ainda segundo o levantamento da Deloitte, as contratações de comissões de colocação, coordenação, além das garantias de liquidação e incentivos, entre outras despesas, representam a maior parte da composição dos custos médios para uma abertura de capital e variam entre 71% (Follon on CVM 476), 80% (IPO) e 82% (Follon on).
Já a contratação de auditores, advogados e de publicidade, junto com outros gastos, aparecem em menor proporção no custo médio das operações, representando 20%, 18% e 29%, respectivamente.
Há cinco anos, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) regulamentou as regras para a captação de recursos financeiros por empresas iniciantes fora do ambiente de bolsa de valores, em operações conhecidas como equity crowdfunding, que permitem a participação de investidores de pequeno porte.
Segundo dados coletados pela própria CVM, houve um aumento de 139% no número de novos investidores desta modalidade de captação, de 8.275 em 2020 para 19.797 em 2021.
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Em relação ao volume captado, o crescimento foi de 123%, de acordo com o órgão regulador. De R$ 84 milhões em 2020, passou para R$ 188 milhões em 2021.
O valor total de captação atingido no ano passado também é 22 vezes superior aos R$ 8 milhões captados em 2016 pelas sociedades empresárias de pequeno porte, ano anterior à edição da norma pela CVM.
Os recursos captados em 2021 pela instrução ICVM 588 – atualizada para a Resolução 88 – também representaram um novo recorde no valor médio de captação por oferta, que atingiu R$ 1.651.411,29. Um aumento de 45% em relação às captações de antes da norma.
“O maior entendimento pelo público investidor e o incremento do uso da tecnologia pelas plataformas para facilitar o investimento são alguns fatores para essa evolução", afirmou Bruno Gomes, Superintendente de Supervisão de Securitização da CVM, em comunicado sobre a primeira atualização da instrução, em abril deste ano.
Um exemplo de empresa que participa de rodada de equity crowdfunding é o Clube FII, plataforma de dados de Fundos Imobiliários para investidores e gestores.
De acordo com o CEO e fundador Rodrigo Cardoso de Castro, a empresa já tem a rodada inteira garantida pela plataforma escrituradora, que assume o compromisso de completar o valor até a meta de captação ao final da oferta, o que é chamado de ‘firme’ neste tipo de operação.
No entanto, Castro e os sócios consideraram importante oferecer a chance de participação da comunidade que representa a base de usuários da plataforma Clube FII.
“Resolvemos abrir a oportunidade para que nossa comunidade e quem acredita em nosso potencial também possa fazer parte desse crescimento projetado. É um tipo de oportunidade que o mercado tradicional financeiro não oferece. Através de crownfunding, é possível investir em empresas que ainda não passaram pela trajetória de maior crescimento, e isso geralmente ocorre bem antes de serem lançadas na bolsa”.
A captação do Clube FII é feita por meio da plataforma da beegin, controlada do Grupo Solum. Desde o início da oferta, em 17 de maio, já foi levantado R$ 1,8 milhão, o que representa 35,4% da meta a ser atingida em seis meses, de R$ 5 milhões.
Dentro da Resolução 88 para as operações de equity crowdfunding, a CVM estabeleceu medidas de proteção a empresas participantes das rodadas de negócios e, principalmente, aos investidores. Uma delas é determinar que o capital social mínimo das plataformas escrituradoras que realizam as ofertas seja de R$ 200 mil.
Quando o exercício – ano fiscal – atingir R$ 30 milhões, é obrigatório ao escriturador a contratação de profissional de compliance, ou seja, aquele que zela pela conformidade e cumprimento da legislação.
Em relação às empresas, a norma prevê a necessidade de contratação de auditoria para as demonstrações financeiras a partir de R$ 10 milhões em receita bruta no exercício anterior, ou quando a oferta pública tem o objetivo de captar acima deste valor.
Para Rodrigo Fiszman, CEO da beegin e do Grupo Solum, a realização de uma oferta pública pelo rito do crowdfunding de investimento combina processos mais simplificados e padrões de governança adequados.
“Com isso, o empreendedor consegue levantar capital a um custo mais competitivo, em um ambiente regulado e com seus interesses preservados", conclui.