Decisão sobre fundo de Abilio Diniz revê interpretação da regra de isenção fiscal para FIIs
Entenda como o fim do processo envolvendo o FII Península no órgão que decide questões de tributação no país pode ser um precedente para a revisão de lei que limita benefício fiscal no mercado FII

A decisão final para um processo envolvendo o Fundo Imobiliário Península do empresário Abílio Diniz que se arrastava desde 2012 no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) representou uma vitória para o mercado FII.
A Câmara Superior - última instância do Carf – decidiu por maioria dos votos que os beneficiários de um Fundo Imobiliário também podem ser controladores do imóvel que é ativo da carteira do FII sem que isso acarrete em cobrança de impostos.

O Carf é um órgão vinculado ao Ministério da Economia que trata de processos administrativos referentes a impostos, tributos e contribuições.
O processo nº 16327.001752/2010-25 tratava de um recurso do controlador do FII Península, o empresário Abilio Diniz.
Criado em 2005, o fundo tinha Diniz como único cotista. No entanto, uma empresa também controlada por ele, a Reco Máster Participações, ingressou no FII como cotista majoritário. Em seguida, o FII Península adquiriu 60 imóveis da CBD, Companhia Brasileira de Distribuição, para pagamento em 20 anos. Atualmente, a receita do fundo vem, principalmente, dos aluguéis recebidos da própria CBD.
A isenção fiscal é uma das principais características dos Fundos Imobiliários. No entanto, a lei que regulamenta dos FIIs criou um limite para evitar concorrência desleal com incorporadoras e locadores de imóveis, que são tributados.
O objetivo da lei é proibir o uso de FIIs pelos chamados ‘sócios do construtor’ e ‘sócios do incorporador’, comuns no mercado imobiliário.
Nesta regra, a vantagem fiscal dos FIIs só é mantida se não houver aplicação de recursos em empreendimento imobiliário que tenha como incorporador, construtor ou sócio, quotista que possua, isoladamente ou em conjunto com pessoa a ele ligada, mais de 25% das quotas.
Fora desta norma, uma tributação normal atribuída às empresas é aplicada ao cotista, ou seja, imposto de renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins. O objetivo da norma (artigo 2º da Lei nº 9.779/99) é evitar a concorrência predatória no setor.
No julgamento do processo do FII Península, prevaleceu o voto do relator, conselheiro Luis Henrique Marotti Toselli, que justificou a decisão no argumento de que nem todo investimento do FII deve ser considerado um empreendimento imobiliário.
“Além da figura dos chamados ‘FII de tijolos’, que são aqueles justamente destinados à incorporação, loteamento e construção de imóveis, desenvolvendo usualmente seus empreendimentos de forma indireta, por intermédio de uma sociedade de propósito específico (SPE), a legislação também admite FII’s destinados a operar com uma enorme gama de produtos financeiros e demais direitos sobre imóveis, dentre eles a aquisição de imóveis prontos para locação. Daí a diversidade deste tipo de Fundo de investimento”.
Na decisão, o relator também descartou a caracterização da CBD como ‘sócia’ do fundo.
“A CBD, embora locatária e antiga proprietária dos imóveis, não manteve qualquer direito de propriedade sobre os imóveis, afinal alienou integralmente esses direitos ao FII Península, que passou a ser o beneficiário dos aluguéis e titular desses ativos imobiliários”.
O FII Península sob gestão de Abilio Diniz é administrado pelo Banco Ourinvest e tem como valor de emissão R$ 23 milhões.
Na visão de Carlos Eduardo Ferrari, advogado especialista em mercado de capitais e sócio fundador do NFA Advogados, a decisão do Carf contribui muito para a utilização do veículo Fundo Imobiliário em diferentes situações, desde que o Carf passe a uniformizar a decisão em casos semelhantes.
"O entendimento do órgão poderá pontualmente ampliar, em alguma medida, operações estruturadas para captação de recursos via mercado de capitais, em especial em situações análogas à do FII Península, em que o alcance das expressões 'sócio' e 'empreendimento imobiliário' estejam presentes".
Para Lucas Dollo, advogado tributarista e também sócio do NFA Advogados, se esta posição prevalecer no Carf a partir do caso FII Península, será um motivo a menos de insegurança jurídica no setor.
"A imprecisão no texto legal afeta FIIs, investidores e administradores. Tal insegurança jurídica foi catalisada a partir desta autuação fiscal [do FII Península] ocorrida há 12 anos", conclui.