Reviravolta na MP 1303: Mudanças para FII, Fiagro e FI-Infra
Relatório representa passo na direção certa, mas batalha continua, ressalta Clube FII

Com prazo final para votação da Medida Provisória (MP) 1303, que prevê uma série de mudanças na tributação de ativos financeiros, investidores ainda aguardam uma definição sobre como ficarão as alíquotas de diversas classes de investimentos. A validade da MP vai até 8 de outubro, ou seja, se não for apreciada até este dia, perde a validade. O relator da medida, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), apresentou seu parecer na última semana com uma série de mudanças em relação ao texto original. O parecer da comissão mista representa uma vitória para os investidores, mas a batalha continua, segundo o Research do Clube FII, que detalhou o assunto em relatório completo.
A MP tramita em comissão mista e precisa ser votada e aprovada por ambas as casas legislativas (Câmara e Senado) para que continue em vigor. Com pressão de representantes destes setores e após acordo negociado nos bastidores, como anteciparam veículos de mídia, o relatório prevê que debêntures incentivadas, Fundos Imobiliários (FIIs), Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagros), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) continuem isentos de Imposto de Renda (IR), com a contrapartida de que a taxação das Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) suba para 7,5% (a MP previa 5% anteriormente). Para os FIIs e Fiagros, valeria a isenção quando os fundos tiverem mais de cem cotistas, o que representa um recuo em comparação ao projeto original, que visava a tributação desses ativos.
Além disso, com o novo texto, estão isentos de IR os rendimentos de aplicações financeiras feitas dentro das carteiras dos FIIs e Fiagros. “Atualmente, qualquer aplicação financeira de renda fixa que um fundo faça para gerir seu caixa, por exemplo, é tributada. Com a mudança, haverá um ganho tributário significativo para os fundos, proporcionando aos gestores maior flexibilidade na alocação de recursos”, ressalta documento elaborado por Danilo Barbosa, Head de Research do Clube FII, e Lana Santos, analista.
O governo abriu mão de taxar instrumentos considerados cruciais para o financiamento de longo prazo, após forte reação de entidades de classe e parlamentares, lembra Guilherme Rheingantz, gestor dos fundos de crédito imobiliário da Rio Bravo. “A isenção preservada nesses casos sinaliza uma tentativa de não minar o fluxo de capital para infraestrutura, habitação e agronegócio. Por outro lado, o endurecimento sobre LCIs e LCAs — agora com tributação prevista de 7,5%, acima da alíquota de 5% originalmente proposta — criou atrito imediato com a bancada ruralista, que vê nessas letras um canal vital para irrigar o crédito agrícola”, pondera.
Vantagens:
- Manutenção da Isenção para FIIs, Fiagros e Outros Ativos
- Isenção na Gestão de Caixa dos Fundos
Desvantagens:
- Aumento de IR sobre LCIs, LCAs, LHs, LIGs e LCDs
- Regime de Competência Mantido
Entenda a ‘MP Taxa Tudo’
Apelidada de “MP Taxa Tudo”, a medida estabelece novas regras para a tributação de aplicações financeiras, incluindo rendimentos de investimentos como ações, fundos de investimento, derivativos e criptoativos. Também são definidas novas alíquotas de imposto de renda para diferentes tipos de investidores, como pessoas físicas, jurídicas e investidores estrangeiros.
O texto original da MP 1303, apresentado pelo governo federal, propõe o fim da isenção de IR para rendimentos de ativos atualmente isentos, como LCI, LCA, CRI, CRA, FIIs e Fiagros. A argumentação do governo para a MP está relacionada à isonomia tributária, mas representantes da indústria entendem que a medida tem caráter arrecadatório. O governo, em vez de cortar gastos, busca novas formas de equilibrar as contas públicas – mas do lado da receita.
Mesmo com a MP em vigor e as alterações no IOF, o Relatório Bimestral de Avaliações de Receitas e Despesas Primárias publicado em setembro ainda estima uma diminuição de R$12 bilhões nas receitas para 2025, aponta o relatório do Clube FII. “Isso demonstra que, embora a arrecadação seja crucial, ela não resolve todo o problema. A disciplina fiscal, por meio da revisão e contenção de gastos, segue sendo o pilar fundamental para a sustentabilidade das contas públicas”, ressalta o documento.
O movimento, segundo o gestor da Rio Bravo, mostra a dificuldade do governo em calibrar medidas que tragam receitas sem comprometer instrumentos historicamente usados para fomentar setores estratégicos, e os ajustes trazem incerteza para o mercado, em um momento em que a previsibilidade deveria ser prioridade.
“Do lado dos investidores, o recado é de cautela. Não apenas pela possibilidade de mudanças abruptas nas regras do jogo, mas porque a própria negociação política — marcada por resistências setoriais e pelo jogo de forças entre governo e Congresso — tende a produzir um texto final que pode divergir significativamente do desenho atual”, argumenta.
Regime caixa x competência
O Clube FII alerta ainda para outro ponto que considera negativo na proposta apresentada pelo governo: o fim da distribuição pelo regime de caixa. Ainda que muitas mudanças ainda possam ocorrer, se a MP passar como está, a maior preocupação é a troca do regime de caixa pelo de competência, segundo Rodrigo Cardoso, sócio-fundador do Clube FII.
“Isso não afetaria apenas FOFs ou FIIs de CRIs: os fundos de tijolo também seriam duramente atingidos. Como sofrem reavaliação anual, é comum haver desvalorização dos imóveis. Nesse cenário, mesmo com inquilinos pagando aluguel, o fundo ficaria impedido de distribuir rendimentos até reverter o prejuízo contábil, o que destruiria o principal atrativo do produto. Não acredito que essa medida avance”, ressalta Cardoso.
Lana Santos concorda e entende que essa mudança poderia levar muitos fundos a deixarem de distribuir rendimentos mensalmente. "A recorrência da renda passiva, juntamente com a isenção, é um dos maiores atrativos dessa classe de ativos para os investidores, e sua alteração pode ter um grande impacto”.
Em relação à retirada da obrigatoriedade de distribuir 95% do resultado semestralmente, Cardoso enxerga que a alteração pode ser vista de forma positiva, ainda que seja polêmica. “Os fundos poderiam continuar distribuindo 95% para atender à demanda do mercado, mas também surgiriam novas estratégias focadas em reinvestimento e valorização de cotas. Isso aumentaria a pluralidade de opções no mercado, sem eliminar a preferência atual dos investidores”.